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Fazia tempo que não colocava meus cascos num consultório médico. Graças ao bom Patrão dos céus sou são de lombo e agradeço por isso. Porém, por motivos de força maior, que são de minha conta exclusiva, tive que fazer uma visitinha a um desses caboclos de jaleco branco e, é claro, tive que ficar numa sala de espera mofando um tempinho.

Só uma hora e meia. Normal. O básico.

Para evitar qualquer manifestação de xucrismo de minha parte, sempre que tenho de enfrentar alguma fila, ou algo similar, carrego comigo um livro. Na verdade, sempre estou acompanhado de dois ou três. Aí, quando minha paciência é colocada à prova, me esquivo, deixando-a bem guardada em minha algibeira, porque sei que a danada é curta, e coloco-me a curtir minhas leituras e, ao final, o que até então era uma sucursal do inferno torna-se uma antessala dos jardins Elíseos.

Bem, como havia dito antes, recentemente tive um desses dias e, pra não ficar esperando à toa o xiru de branco, me atraquei nas páginas de um livro.

O problema, porque sempre tem um, é que havia me esquecido que em todas essas antessalas sempre há um televisor ligado em algum canal da grande mídia delirante, em algum programa de conteúdo abusadamente fecal, que fica ali, sintonizado, na vã tentativa de quebrar o clima sorumbático que impera entre as cadeiras longarinas.

É um senhor nos acuda.

Virava e mexia aquela tranqueira balançava o castelo de cartas da minha concentração e, sem querer querendo, acabava por ouvir um cadinho aqui, outro acolá, do que estava sendo regurgitado midiaticamente em meus ouvidos.

De vez em quando olhava para a telinha maldita e, vez por outra, volvia meus zóios para ver o rosto dos demais penitentes que estavam na mesma sala de suplícios e reparei algo, no mínimo, curioso: ninguém estava prestando atenção, por mínima que fosse, para os ruídos que saiam daquela tela plana.

Todo mundo, ali, estava nem aí.

Trocando em miúdos, mais uma vez um aparelho de televisão permanecia ligado como um claro sinal de desrespeito a inteligência humana. Só pra dar azia.

Mas o pior era o conteúdo. Sim. O conteúdo. O assunto vinculado por quase uma hora e meia era um requentado sobre o tal “gabinete do ódio” junto com informes gerais sobre o vírus chinguilingue.

Gabinete do ódio. Caramba. Quem inventou esse nominho para carimbar seus adversários políticos deve ser uma pessoa muito fofa mesmo, principalmente agora que Felipe Neto se uniu a causa. O imitador de foca, que sabe muito bem com quantos paus se faz um vídeo infanto-juvenil, não é fraco. Não mesmo.

É. Os “espalhadores de ódio” que se cuidem.

Bem, é só para esses abençoados que seria algo odioso a presença, no ambiente virtual, de memes, piadas, gracejos e anedotas sobre políticos e figuras influentes.

Aliás, basta prestar um cadinho de atenção nas manifestações dessa galerinha que se autoproclama a encarnação redentora da “tolerância”, para constatar em que consiste toda essa doçura.

É muita boa intenção em tão poucos corações. Coisa linda de se ver.

Talvez o melhor exemplo disso seja as recentes atitudes tomadas pelas vetustas figuras da corte dos Supremos togados do “ministério da magia” que, sem o menor pudor, estão deixando de castigo todos aqueles que sejam considerados uma ameaça ao tal “Estado demo-crático de direito”.

Parêntese. Uma corte que conta com a presença de certas excelências que se acham umas gracinhas, mas que são desprovidas de graça e despidas da Graça. Fecha parêntese.

Não sei por que, agora agorinha, me lembrei das apresentações memoráveis do comediante Agildo Ribeiro que, em rede nacional, nos anos oitenta, tirava a maior sarro com a cara do faraônico José Sarney. Era de cair os butiás do bolso.

Não sei por que me lembrei agora, também, das charges estampadas na Revista Dom Quixote, que era editada e ilustrada por Ângelo Agostini no final do século XIX, começo do século XX.

Não sei? Claro que sei. Bem provavelmente o primeiro seria calado e os exemplares da segunda seriam recolhidos pela turma da ternura democrática, pois, onde já se viu fazer graça com aqueles que se consideram acima, além e adiante da Graça, não é mesmo?

Mas fiquemos tranquilos. De boas. Afinal, se os homens e as mulheres de preto estão chamando para si o papel de editores da galáxia para nos proteger desses filhotes dos comensais da morte – no caso, os seguidores e discípulos do Voldemort da Virgínia, que integram o tal do misterioso e secretíssimo “gabinete do ódio” - é porque isso será algo bom para todos; digo, algo “do bem” para alguns, não para nós.

Pois é. Infelizmente, para alguns, os fins escusos justificam os meios pérfidos.

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela - e-mail: dartagnanzanela@gmail.com

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