Digite pelo menos 3 caracteres para uma busca eficiente.

O avião tentava pousar no meio das montanhas. Ora parecia que uma das asas ia tocar o solo e tudo virar uma porção de destroços. Finalmente, para alívio geral, as rodas encontraram o solo de Paro, a capital do pequeno reino do Butão, no meio da Ásia. País de tradição budista, com belíssimos mosteiros antigos, com mais da metade do território preservado, e um povo pacífico cujo esporte nacional é o torneio de arco e flecha. O pequeno Butão é o patrocinador de uma proposta na ONU para que a medição conhecida como PIB – Produto Interno Bruto, seja trocada por outra. Ele propõe o FIB – Felicidade Interna Bruta, ou seja que o bem estar, a tranquilidade, o entendimento, a aproximação entre pessoas de religiões e culturas diferentes, também sejam avaliados. À princípio me pareceu uma maluquice, mas depois, conversando com membros do governo local, soube que a proposta conta com o apoio de mais de uma centena de países, e um estudo teórico sobre a metodologia para averiguação de desempenho desenvolvida na Universidade de Columbia.

O convite do governo do Butão era para uma reunião na ONU e o tema a viabilidade do FIB. A plateia comportava uma verdadeira multidão em um dos salões inferiores do prédio em Nova York. Presentes o primeiro ministro do Butão, envergando o tradicional quimono, e uma plêiade de gente comprometida com a maior distribuição da riqueza no mundo e a defesa do meio ambiente. Eu imaginava uma plateia de doutos scholars com suas gravatas, lap tops e cabelos bem penteados. Ledo engano. No mar de assistentes uma profusão de pessoas vestidas com os seus trajes nacionais. E  para minha surpresa, muitos religiosos. Sentei-me ao lado de um rabino de meia idade, de Nova York, que  me fez uma série de perguntas sobre o Brasil. Tentei contar quantos outros religiosos lá estavam: islâmicos, católicos, evangélicos, hinduístas, budistas, zoroastristas, africanos de várias origens... Perdi a conta. Pelo menos um terço da audiência  era formada por líderes religiosos, muitos não consegui identificar a que religião pertenciam.

Os discursos dos líderes políticos começaram e cada um dava a sua versão do que entendiam ser a felicidade e como deveria ser medida e avaliada em todos os países. Depois de pelo menos duas horas, o mediador anunciou que cada religião representada no plenário, teria três minutos para falar. Houve uma inversão de discurso. Todos falaram a mesma língua, ressaltaram o respeito pela diversidade, o princípio da não violência, da tolerância, da ajuda mútua, da compaixão e do amor. Só depois de ouvir a todos é que compreendi a importância da presença dos líderes religiosos no evento. Os discursos inter religiosos deixavam claro que ao invés de afastar pessoas, comunidades, povos e nações eles aproximavam. Lembrou-me a Roda de Newton, que é formada por várias cores, mas quando girada é possível ver uma única cor.

Esta experiência vivida por mim mostrou-me quanta importância tem o diálogo inter religioso e as imensas contribuições que podem dar a humanidade, mesmo em um campo aparentemente áspero e materialista como a economia. A reprodução desses encontros em níveis mundial ou local precisam ser incentivados e cabe ás lideranças religiosas provocarem. Certamente caminharemos com mais tranquilidade em busca da paz. O livro Diálogo Religioso, da Paulus,  é mais um passo inspirador graças a coordenação do Cônego José Bizon e do Rabino Michel Schlesinger e idealizado por Afonso Moreira Júnior.

Heródoto Barbeiro – jornalista, educado na tradição budista da escola Soto Zen.  herodoto@herodoto.com.br

#JornalUnião

Utilizamos cookies e coletamos dados de navegação para fornecer uma melhor experiência para nossos usuários. Para saber mais os dados que coletamos, consulte nossa política de privacidade. Ao continuar navegando no site, você concorda integralmente com os termos desta política.