Poesia: As curvas
Vejo do alto minha cidade acabrunhada
prédios brancos parecem encardidos
os cremes parecem rubros envelhecidos
as arquiteturas fenecem como que mortas
o choro parece unânime e contido
os córregos parecem cursos de lágrimas
a imprensa se agita para despertá-la
mas suas notícias são amargas e vergadas
a um ramerrão em que se inserem casmurras
matam-se os jornalistas para revigorá-las
o padre da capela de meu bairro acorda cedo
e se apega ao Novo Testamento
o antigo tornou cansativas suas lendas
em breve rezará a missa e precisa de um tema
o frentista, sempre alegre, arrisca uma piada
bem aventurados os pobres piadistas
porque deles será o reino deste mundo
o frio não corta mas ameaça
a lua se foi, meio envergonhada
de ter-nos iluminado por tantos séculos
e ver-nos olhando-a com olhos depressivos
mais do que milagrosas ciências econômicas
precisamos de novas cores inspiradoras
de novas culturas, novos amores e novas amizades
de pouco valem as estonteantes conquistas
propiciadas por ciências esquisitas
que criam ablações inimagináveis
e foram derrotadas por micróbios
escondidos à nossa espera, os hospedeiros,
estalagens enfurnadas nas florestas
e o sol desperta levemente minha cidade
os crepúsculos são tristes
ao enterrar e ressuscitar os mistérios
que nos embalam
como passageiros de um trem nas curvas das mesetas.
Amadeu Garrido de Paula, poeta e ensaista literário, é advogado, atuando há mais de 40 anos em defesa de causas relacionadas à Justiça do Trabalho e ao Direito Constitucional, Empresarial e Sindical. Fundador do Escritório Garrido de Paula Advocacia e autor dos livros: “Universo Invisível” e “Poesia & Prosa sob a Tempestade”. Ambos à venda na Livraria Cultura.
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