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Dom Ricardo Hoepers afirma que centralidade da CF 2020 está no ato de ver, sentir compaixão e cuidar

A Campanha da Fraternidade deste ano tem como tema “Fraternidade e Vida: Dom e Compromisso”, um chamado a um olhar atento sobre a vida humana. O bispo da Diocese de Rio Grande (RS) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB, Dom Ricardo Hoepers, comenta a centralidade da CF 2020.

O bispo ressaltou a necessidade do cristão, ao ver o sofrimento do outro, ser capaz de se compadecer e de se comprometer a cuidar do próximo. Dom Ricardo também levantou na entrevista questões como a drogadição e o suicídio, problemas oriundos da falta de sentido da vida, que acometem a sociedade atual. Confira abaixo a íntegra da entrevista com Dom Ricardo:

O tema da CF 2020 levanta a questão da vida. Qual a importância de se tratar deste tema?

Dom Ricardo Hoepers – O tema deste ano da Campanha da Fraternidade “Fraternidade e Vida: Dom e Compromisso” e o lema que é exatamente o Bom Samaritano, com os três verbos “viu, sentiu compaixão e cuidou” nos leva a um compromisso e a uma mobilização em torno da promoção e da defesa da vida. A questão da vida hoje é muito séria. Estamos vivendo um mundo extremamente fragilizado. A pessoa humana, que deveria ser o centro das atenções, do cuidado, do zelo de toda a sociedade, está ficando em último lugar. Em primeiro lugar estão vindo outros valores, valores materiais, de interesse: o dinheiro, o poder, a competição. E claro que tudo isso gera violência, gera conflitos, então trabalhar com a vida é trazer novamente a centralidade que Cristo nos ensinou: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância”.

Que relação há entre fraternidade, vida, dom e compromisso?

Dom Ricardo – É a centralidade de um Deus amoroso, criador de todas as coisas, que deu ao homem e à mulher este grande dom: o dom da existência. Então por isso podemos ligar tranquilamente a questão da fraternidade, porque somos irmãos. Se a vida é um dom, é um dom dado por Deus, este Pai amoroso que nos concedeu este presente que é ‘o viver’. Por isso somos irmãos, e daí vem a palavra fraterno, que vem de frater, de irmão. Nós somos uma família, a Casa Comum que o Papa Francisco fala.

Também somos responsáveis uns pelos outros. Responsáveis pela administração desta Casa Comum, deste dom. Então ‘vida’: Dom de Deus, vem do Alto, presente de Deus. Daí vem o nosso compromisso: Já que somos irmãos, fraternos, aldeia global- como diz o Papa no Pacto Educativo, ou na Economia de Comunhão, que é a proposta do Papa- se todos nós somos responsáveis por tudo neste mundo, quanto mais pelas pessoas que nos foram confiadas, que estão ao nosso lado, perto de nós, ou pelas quais nós passamos todos os dias. Saltam aos nossos olhos as necessidades, a fragilidade, a pobreza, a miséria, a dor, o abandono dessas pessoas. Então vem esse chamado a nos comprometer com o outro. Por isso o lema é este, do bom samaritano que viu, sentiu compaixão e cuidou. Aqui está a centralidade da CF 2020: somos irmãos, temos um dom que nos foi dado, vamos nos comprometer em cuidar um do outro, como uma família, como quem se preocupa, se interessa pelo outro, pela dignidade do outro, pelo valor que a vida tem.

Quais os desafios em relação ao tema em termos de Brasil?

Dom Ricardo – Os desafios no Brasil são grandes. Nós temos uma série de problemas sociais, vivemos uma crise econômica muito grande, um desemprego, que talvez na história seja um dos maiores, e precisamos olhar para isso e ver ao nosso redor o que a realidade está dizendo. As nossas comunidades – ali na base mesmo, nas paróquias- sentem isso, percebem. Percebem o aumento da drogadição, da miséria, do número de moradores de rua, da pobreza, o aumento da depressão, da solidão, do abandono. Isso tudo está do nosso lado, está acontecendo ao nosso redor. A Campanha da Fraternidade que é vivida na Quaresma é um ‘chacoalhar o coração’ pra dizer: Vamos tirar esse coração de pedra e colocar um coração de carne! Vamos ter mais paixão, mais ternura nas mãos, no coração, e por isso a imagem da Irmã Dulce, que é aquela que não deixou ninguém abandonado. As pessoas que passavam por ela, ela dava um jeito de acolher e de cuidar. Isso é um chamado de atenção para nós.

Será que estamos muito frios, muito calculistas, deixando da beleza desse nosso ser cristão para olharmos só para nós mesmos, numa vida individualista, ou numa espiritualidade sem os pés no chão, ou sem olhar ao nosso redor? Jesus nos mostra que ao contrário, Ele ia ao encontro, curava as pessoas, ouvia, dava dignidade novamente: ‘vá, não peques mais, retorne à sua casa, à sua vida’. A Palavra de Jesus era fruto do seu olhar de compaixão, Ele olhava e não passava adiante, por isso a história do Bom Samaritano, que cuidou e que se comprometeu.

Como os trabalhos de assistência que a Igreja já faz devem caminhar a partir da CF 2020?

Dom Ricardo – Todos os trabalhos de assistência social, mas também todos os trabalhos de acompanhamento que a Igreja tem, devem agora a partir da Campanha tomar uma força maior, uma sensibilidade maior. Será que agora não é o momento da Igreja fortalecer ainda mais seus trabalhos de acompanhamento de famílias, de jovens? Vemos tantos jovens caindo na drogadição, mas por outro lado há tantos se suicidando porque perderam o sentido da vida. O nosso ser cristão, esse dom que Deus nos deu agora tem que se colocar a serviço pra trazer mais vida pras pessoas, mais esperança no coração delas.

Os trabalhos de assistência social não podem ser só um trabalho de desencargo de consciência para dar ajuda a quem não tem. Isso faz parte. Mas também acompanhar essas pessoas, ajudá-las a crescer, a sair de uma situação de fragilidade e a ter novamente dignidade na sua vida, vontade de viver, porque às vezes as pessoas nem vontade de viver têm mais. Então, se nós dermos este passo, mostrarmos que a vida vale à pena, já vamos estar ajudando muita gente a sair de uma situação de fragilidade, ter novamente a vontade de reconstruir o seu caminho.

A vida muitas vezes é desrespeitada, desprezada. Como os cristãos podem se comprometer a promover e defender a vida?

Dom Ricardo – A palavra é essa: sendo capazes de ver como Jesus viu, sendo capazes de sentir compaixão como foi o Seu coração misericordioso, que não abandonou nenhum daqueles que a Ele foram confiados, e sendo capazes de cuidar, se comprometer com as pessoas, acompanhá-las, estar do seu lado. Às vezes só uma presença, uma companhia, pode salvar uma vida.

Essa campanha está de portas e janelas abertas. Basta nós começarmos a olhar ao nosso redor, e um pequeno gesto, um gesto de presença, de amizade, de companheirismo, de tempo para ouvir, de tempo para dar atenção, podem ser gestos que venham a mudar a vida de uma pessoa.

Que possamos, de fato, trabalhar a Campanha da Fraternidade sob essa perspectiva: ter um olhar de compaixão e de cuidado, como Jesus fez.

“Estamos vivendo um mundo extremamente fragilizado. A pessoa humana, que deveria ser o centro das atenções, do cuidado, do zelo de toda a sociedade, está ficando em último lugar.” Dom Ricardo

“A Campanha da Fraternidade que é vivida na Quaresma é um ‘chacoalhar o coração’ pra dizer: Vamos tirar esse coração de pedra e colocar um coração de carne!” Dom Ricardo

Denise Claro/noticias.cancaonova.com

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